Na esfera local, o fato de o governador Jaques Wagner ter vendido a uma marca de lâminas de barbear os pelos da barba e do bigode que cultivava há 30 anos obteve muito mais destaque no noticiário não apenas televisivo, mas de todas as outras mídias, do que a greve e o impasse em torno dela envolvendo os professores das universidades estaduais e o mesmo governo do barbeado em questão. E é preciso admitir que se vive em um tempo em que é assim que as coisas se movem. Ou seja, quem quer saber de milhares de alunos sem aula, de professores parados e de suas pautas de reivindicação, e, menos ainda, de que o mesmo petismo que sempre amou uma assembléia e paralisação de qualquer ‘catiguria’ agora corta o salário dos professores em greve se o governante é tão bem intencionado que sacrifica os cabelos da cara por R$ 500 mil em nome da nobreza da causa da educação? Sim, para quem não sabe, o cachê pago pelas barbas do governador irá, centavo a centavo, para o campo da educação na Bahia.
COISAS FEIAS - Na mesma semana desse feito publicitário e de marketing pessoal e político sem precedentes na história desse estado, o telespectador acordou na segunda-feira ainda sob o efeito (e por que será que repórteres de rádio e TV, aqui e alhures nunca sabem que sob não pode nunca ser sobre?) do estômago embrulhado com as imagens de mais uma das matérias denúncias do Fantástico, desta vez sobre coisas inacreditáveis que ocorrem quando o assunto é merenda escolar Brasil afora.
A Educação, embora sempre, no Brasil, esteja condenada aos piores tratamentos governamentais, é um tema que ocupa reiteradamente espaços mais do que generosos no noticiário televisivo. Durante toda esta semana, enquanto o Jornal da Band se transformou em um panfleto quase agressivo dando voz tão somente aos donos do agro-negócio diante da cobertura da reforma do Código Florestal no Congresso, o Jornal Nacional abriu um espaço gigantesco para os desafios da educação, em uma série de matérias especiais sobre o tema ao longo da semana.
Do mesmo modo que o marketing político sabe que a imprensa irá toda saracoteante atrás do merchandising governamental inflado pela parceria público-privada (entre o Governador da Bahia e a marca de lâminas) em nome da sacralizada causa da educação, os gestores que aparecem mal na fita em matérias já rotineiras sobre denúncias na educação também já sabem a receita de bolo para tentar safar-se das coisas feias que fazem em seus rincões. Diante de uma denúncia num telejornal, a receita é dar satisfação à referida emissora e equipe de reportagem, mesmo que no dia seguinte os alunos continuem mergulhados no mesmo abismo qualitativo e quantitativo. Fazem uma maquiagem tipo meia-sola do fato denunciado diante das câmeras e parecem acreditar que fica tudo certo. E o pior é que fica, pois, no dia seguinte, os mesmos alunos pobres e sem voz nem vez estarão tão mudos quanto sempre.
ARMENGUE - Em uma das escolas visitadas pela reportagem do Jornal Nacional, em Teresina, a Secretaria de Educação, o Governador, a Diretoria da Escola, quem sabe quem ou quem sabe todos juntos, assim que se tomou conhecimento da passagem da TV pelo local, acorreram magotes de pedreiros, carpinteiros, marceneiros, pintores e tudo o quanto é mão de obra inexistente o resto da vida para fazer um armengue de fachada nas instalações do prédio, que, na véspera, eram menos vistosas que as cavernas afegãs onde um dia acreditou-se que Bin Laden escondia-se. Beira a imoralidade com a cidadania dos alunos e professores da escola ver uma tropa de choque de operários trabalhando em função não do direito dessas pessoas de terem um lugar para estudar e trabalhar minimamente digno, mas tão somente para dar satisfação a uma emissora de TV.
Em um país em que tudo na educação pública ou é abismo ou é performance, a economia pode ir tão bem quanto a do resto do mundo, mas o povo será sempre composto por batalhões de derrotados diante de outros países onde a educação levou a sociedade para outros caminhos. O tão comemorado acesso ao consumo é formidável, mas não custa lembrar que ele pode se espatifar diante dos sinais mais encorpadinhos de volta da inflação. Já a educação de qualidade e o investimento a curto, médio e longo prazo em qualificação de mão de obra serão sempre uma receita formidável para qualquer nação sair do buraco. Aqui, não se consegue parar de jogar lixo da janela do carro, coletar o lodo coletivo depositado nas calçadas, mas as cantantes endinheiradas estão em todos os outdoors numa briga de foice exigindo que a abertura da Copa seja aqui, uma cidade que nem buzu tem. Yes, we can.
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