terça-feira, 10 de novembro de 2009

Zina, O Herói

O programa Pânico, que sempre tripudiou da privacidade de quem quer que um dia tenha tido 15 minutos de fama, resolveu dar lição de moral à população, ao resto da mídia e às autoridades públicas. Bastou um dos seus integrantes ser preso com cocaína para o programa de humor escrachado ficar seríssimo e bater pé contra o resto do mundo que divulgou ou consumiu a informação. Ora, não foi o Pânico que infernizou a vida da atriz Carolina Dieckmann e sua família, escalando até mesmo um edifício para filmá-la da varanda? Somente o impedimento judicial interrompeu o assédio.

O mesmo programa perseguiu o falecido Clodovil quase lhe causando um acidente de carro, com o propósito de fazê-lo calçar as tais sandálias da humildade. Uma unidade móvel da RedeTV fazia ponto em frente ao apartamento de Clodovil e em uma das investidas, exibida na TV, o programa usou um comboio de carros, um trio elétrico e um helicóptero para perseguir o costureiro no trânsito de São Paulo, com direito a fechadas em seu carro, tudo a pretexto de ridicularizá-lo e humilhá-lo.

MURRO – É também o Pânico que chega com suas câmeras e repórteres engraçadinhos nas praias badaladas do Brasil e até de outros países para ridicularizar o corpo das mulheres que não se encaixam no padrão Playboy. Não foi à toa que um dos integrantes da equipe levou um murro na cara, desferido por Victor Fasano e que o programa foi alvo de uma carta de repúdio de Wagner Moura, outra vítima da trupe, atingido na cabeça por um gel melequento, atirado pela equipe do programa, ao sair de uma cerimônia de premiação.

Mas como o corporativismo de qualquer integrante da raça que atende pelo nome de televisiva é sempre disforme, o mesmo Pânico que se acha no direito de tripudiar da privacidade de todo mundo subiu nas tamancas de raiva quando a imprensa noticiou que sua mais nova aquisição, um esquisitão que atende pelo nome de Zina, fora preso com cocaína.

HOLIFYIELD – É mérito não saber quem é o sujeito. Trata-se de um desses indivíduos inadjetiváveis que ficam famosos justamente pelo que não têm: cérebro. O tal foi contratado para ser freak porque gritou “Ronaldo’, de uma maneira tão abobalhada diante de uma câmera de TV que deixou claro que havia CID (Classificação Internacional de Doenças) para seu caso. Diante de qualquer grunhido, sílaba, palavra ou coisa pronunciada por Zina, os comentários de Reginaldo Holyfield na TV baiana tornam-se passíveis de decupagem e publicação em um livro que o consagrará à Academia Brasileira de Letras, onde obras piores com insetos no título já levaram péssimos autores a ganhar fardão de imortal.


Na primeira edição após a prisão de Zina, o Pânico deixou de lado o humor e passou infindáveis minutos atacando moralmente a imprensa, a TV, o diabo e o planeta por terem noticiado o fato. Sobrou lição de moral para todos os lados e quem duvidar do absurdo da coisa que vá resgatar a pérola no Youtube. A informação mais leve foi a de que ninguém poderia dizer um A do sujeito, pois 25% da população brasileira é igual a ele. Descerebrada e incapaz de dizer coisa com coisa? Não. Dependente química. Sim, o pânico acaba de revelar um assombro nacional: um quarto dos brasileiros é dependente químico.

A Polícia e o Ministério da Saúde tiveram sua incompetência ressaltada em entrevistas de populares e picaretas de plantão. Zina? Ora, foi descrito como uma criança, um ser puro com quem todos na equipe aprendem nobreza. Apresentadores foram às lágrimas diante da história trágica da condenação moral de um herói da TV.

BEATIFICAÇÃO - Alguém vê reação semelhante quando esses meninos ferrados das periferias são assassinados acusados de tráfico? Quem já viu a RedeTV comprando uma briga dessa natureza diante dos mortos nos tiroteios com os quais a TV faz a trilha sonora de fundo do jantar dos brasileiros? Entretanto, um desorientado pago para ser bobo da corte, o mais freak entre os freaks numa atração de TV, é preso por droga, vira notícia e um país inteiro é acusado de omisso, irresponsável e algoz desse sujeito. Por que não aproveitam o embalo da piada e pedem logo ao Papa a beatificação de Luciana Gimenez, a outra estrela santa e intelectual da casa?

Por Malu Fontes, Jornalista, Doutora em Comunicação e Cultura e Professora da Facom-Ufba

5 comentários:

Ana Maria C. Bruni Territorio Mulher disse...

Pânico, só o nome já diz tudo!
Por acaso a audiência está batendo os outros programas do horário.

Existe um link onde se pode denunciar certos programas
http://www.eticanatv.org.br/
...
Sobre o Pânico na TV Ranking
http://www.eticanatv.org.br/index.php?sec=2&cat=5&pg=2


Podemos contribuir com a ética na tv através de nossa manifestação

Anônimo disse...

Odeio este programa e fico indignada como é possível isso ser transmitido na TV. Eles não respeitam ninguém e se acham os tais. Se este elemento foi pego com drogas, tem mais é que ser divulgado pra verem o exemplo que estes cretinos passam.
Abraços,
Janeisa

Anônimo disse...

Muito bom artigo. E eu creio que a coisa é mais profunda ainda. Zina para eles não vale nada. O que vale é a audiência, o dinheiro. Quando o Zina não der audiência, ele vai ser chutado, sem cerimônias!

Abraços e sucesso no seu blog!

Gilmarzinho disse...

A RedeTv está tratando o caso com um eufemismo descomensurado.
Lástima.
E no dia em que foi veiculada a notícia, existia a acusação de que ele estaria armado. No dia seguinte esta informação "desapareceu" das manchetes, nem sequer foi desmentida. Estranho, não.
Té.

Fernanda disse...

Olá Ricky,

Belíssimo texto. Muito bem redigido e de conteúdo!
Concordo contigo! O Pânico as vezes pega pesado. Eles poderiam optar mais pelo humor inteligente, pois, o formato do programa é bem inovador.
Também sou contra à perseguição aos famosos. Acho que é algo humilhante.
Parabéns pela abordagem do tema.
Abraços, Fernanda pautajornalistica.blogspot.com