sábado, 24 de janeiro de 2009

Punição, só para os bons

Por Marcel Leal

A juíza Iara Silva Dourado condenou o jornal A Tarde porque supostamente acusou o delegado Gilson Prata de ser um dos mandantes do assassinato de meu pai, Manoel Leal.
O crime completou 11 anos com esta punição para quem cobrou justiça e nenhuma para os mandantes.
Mesmo com risco de ser condenado também, minha opinião é de que Gilson Prata tem tudo para ter sido um dos mandantes e muitos indícios apontam direto para ele.
O policial Monzar Brasil, executor condenado a 18 anos de prisão pelo assassinato, é seu sócio e parte de sua equipe.
Aliás, os dois fizeram o trabalho sujo encomendado pelo então prefeito Fernando Gomes na prefeitura, recebendo pagamento por fora para isso.
A Secretaria de Segurança já confirmou que o pagamento foi ilegal. Na época, Fernando e Gilson Prata foram denunciados juntos em A Região.
A matéria, demolidora, acabou com as chances de Prata ser Secretário de Segurança, cargo para o qual era cotado.
Monzar não conhecia meu pai nem Itabuna, não tinha nenhuma ligação com a cidade. Logo, para participar do crime, tem que ter sido mandado por alguém de fora daqui.
E a pessoa mais próxima, seu chefe e sócio, era Gilson Prata. O julgamento já provou que Monzar atirou em meu pai seis vezes, duas pelas costas.
Ficou faltando investigar quem o contratou. Isso nunca foi investigado na gestão de Paulo Souto e Cezar Borges, cúmplices por omissão no caso.
Da mesma forma, Monzar não poderia cometer o crime numa cidade que não conhecia, numa avenida entre o quartel da PM (na época comandado por Gilberto Santana e, naquela noite, inexplicavelmente vazio) e o Complexo Policial.
Ele teve a parceria de, segundo três testemunhas, Marcone Sarmento, visto por elas no local e dia do crime.
Marcone é protegido (de público e há muito tempo) por Maria Alice Pereira, presidente do Demo na cidade e braço político direito de Cuma.
Cuma, Alice e Prata nunca foram investigados.
A matéria de A Tarde foi feita, de forma séria, honesta, por Marconi de Souza que, junto com Levy Vasconcelos, foram essenciais na luta para que o décimo assassinato de um jornalista na Bahia nos anos 90 fosse investigado.
Marconi, Levy e A Tarde merecem prêmio e não castigo. Os três e A Região conseguiram um feito inédito na história da Bahia: fazer uma investigação de assassinato de jornalista durar mais que uma semana.
A Justiça devia punir quem matou, quem mandou matar, quem ajudou a matar e quem acobertou esta quadrilha na polícia, no judiciário, no governo e na imprensa.
E não quem lutou para que a justiça seja feita, para que os suspeitos sejam investigados e os culpados punidos.
A justiça deveria garantir a liberdade de imprensa.
Garantir que jornalistas não seriam assassinados por fazer sua obrigação. E que, em caso de atentado, os culpados iriam para a cadeia.
A justiça não deveria ser garantia de impunidade para os criminosos. Jamais.

Uma represa de lágrimas
Desde a noite em que meu pai foi assassinado me vi jogado num furacão de tarefas, problemas, providências e lutas tão grandes que até hoje não consegui chorar sua morte.
Acho que isso só vai ser possível quando vir mandantes sendo condenados.
Aí as lágrimas represadas nestes anos vão jorrar soltas, sem amarras, sem limites.
Até lá será esta saudade doída, diária, constante, do homem que me deu exemplos inestimáveis, que ensinou as lições mais importantes, que me fez como sou hoje.
A saudade das gozações, das brincadeiras, do papo na varanda da chácara, das Malhas Finas arrasadoras, do coração generoso e sem fundos.
Minha mãe muitas vezes reclamou que ele deixava faltar em casa para ajudar alguém.
É verdade. Vi ele ficar sem dinheiro para ajudar amigos, sem carro para emprestar a um visitante, tirar de onde não havia para salvar outros.
Não considero que faltou nada em casa nem na minha vida. Até porque o mais valioso ele me deu, que foram exemplos do que é certo ou errado.
Meu pai trabalhava muito e por isso não foi tão presente em casa como eu gostaria.
Mas cada minuto em que ele estava com a gente valia por horas, dias. Meu pai gostava de alegria, de prazer, de festa.
Defendia os fracos e lutava contra injustiças. Não mataram só um homem, e sim uma referência de vida.

Marcel Leal
marcel@grapiuna.com

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